O Cifras.pt esteve à conversa com o Toni Barreiros, mentor da iniciativa Sons à Sexta. Falámos sobre o início do projecto, o seu crescimento, as dificuldades encontradas ao longo do caminho e muito mais. Lê a entrevista abaixo!





Começa por falar-nos do início dos Sons à Sexta. Onde e quando é que nasceu e quais foram os objectivos a que te propuseste?

Toni (T) – Os Sons à Sexta nasceu em 2016, apesar de já vir do passado, do qual eu fiz parte, na associação do Teatro Clube de Alpedrinha, desde 2007, com um grupo de amigos. Alpedrinha tem uma pequena comunidade muito ligada à musica e ao som, sendo que, desde pequenino, tive um grupo de amigos com quem ia para festivais. Quando, em 2007, regresso ao Fundão, uma coisa com que me deparo quando chego a Alpedrinha, já que eu sou de lá, é que não se passa nada. Então, com o tal grupo de amigos que tinha, decidimos candidatar-nos ao Teatro Clube de Alpedrinha, que na altura era uma estrutura semi-abandonada. Sem ninguém perceber nada de produção ou algo do género, começámos por organizar uns concertos de amigos, muito amadores. Para vocês terem uma ideia, eu não percebia nada de luzes e era eu que as fazia e o Gonçalo não percebia nada de som e era ele que tratava disso. [risos] Mas a ideia era: não vamos mais aos concertos, os concertos que venham a nós. Nós nem pensávamos em todo o trabalho que aquilo envolvia, porque só o facto de não pagarmos para ir ver um concerto, era espectacular.

A banda que lançou o Teatro de Alpedrinha, foi os Norton – uns amigos meus, aqui de Castelo Branco. É a grande banda dentro do conceito do “Lado B” da música. Lembro-me que eles foram lá e disseram: “Vocês são malucos? Nós não conseguimos tocar aqui. Vocês não têm P.A., não têm nada.” Estava lá eu o Gonçalo e aquilo mexeu comigo. Senti-me um bocado ofendido, porque era um esforço tão grande, meu e da minha equipa. Conforme ele diz aquilo, a malta olha para mim: “Então meu? Estes gajos chegam aqui, dizem isto e nós vamos desistir?”. Então, pedi aos Norton uma lista do que precisavam. Eles mandam-me uma lista com um rider completo, com estrados no palco, mais parecia os U2, sendo que eu nem nunca tinha visto um desenho de palco. [risos] Mas acabou por ser giro, porque eu falei com milhares de pessoas e, mesmo ao lado, em Alcains, fui encontrar um amigo que tinha tudo. A partir daí, era sempre o João que ia fazer o som. Foi graças à exigência dos Norton que percebi o que era preciso.

 

Há uma afirmação que tentam combater: “País é Lisboa e o resto é paisagem”. Achas que essa batalha se tem tornado cada vez mais fácil?

T – Hoje, isto é completamente diferente mas, no início, foi uma grande luta. Claro que as pessoas não sabiam onde é que era Alpedrinha e Fundão. A maior parte das bandas são de Lisboa e Porto. Braga e Guimarães também estão a aparecer e Leiria também já tem uma programação fixe, com o Hugo Ferreira. Mas se vocês repararem, isto surge tudo mais ou menos na mesma altura. Ou seja, nós não nos conhecíamos e começámos todos a fazer o mesmo. Sem querer, isso facilitou, porque quem vem a Leiria, vem ao Fundão, quem vem ao Fundão, vai a Tomar – começa a haver aqui um circuito. Depois lá está, também o nosso alinhamento e aquilo que gostamos, anda tudo muito dentro do indie, do pop e do electrónico e tentamos sair do circuito habitual do comercial. Trabalhamos com o “Lado B” da música portuguesa.

 

Que artistas desse “Lado B” da música portuguesa é que já conseguiste trazer? Há uma dificuldade acrescida em esgotar salas, assim?

T – Não tenho esses números em mente, mas, só agora, nos Sons À Sexta, já passaram mais de 100 músicos. Em termos de pessoas, só o ano passado, passaram pela Moagem mais de 2000. Numa sala pequenina, com 140 lugares. Nós, neste momento, esgotamos sempre, mas no início não. Mas lá está, isto veio do Teatro de Alpedrinha. Para vocês terem uma ideia, para conseguir esgotar salas, em Alpedrinha, eu demorei 4 a 5 anos. Ainda assim, levámos lá Rita Redshoes, por exemplo, que é um nome comercial e que esgotou. Mas pronto, o primeiro ano dos Sons à Sexta, em 2016, foi um bocadinho difícil, porque foi novidade. Fundão não tem hábito de consumir este tipo de projectos, por isso acabámos por fazer para as pessoas de fora. Mas isso não é problema, é preciso é que as coisas aconteçam. No segundo ano, comecei a esgotar salas e, neste momento, sempre que há Sons à Sexta, está esgotado. Isto já é uma família que foi aqui criada, que é muita gente da Covilhã, de Castelo Branco, de Alcains e de Alpedrinha. Mesmo internacionalmente, também vamos fazendo o Open Sounds – um projecto que eu tenho, paralelo com os Sons à Sexta, que traz bandas internacionais ao Fundão. Já trouxemos os Nouvelle Vague, Nicola Conte, Chk Chk Chk, The Last Internationale e, recentemente, veio o brasileiro, Rubel. Isto para vos dizer que, apesar de em Alpedrinha ter começado como uma brincadeira, agora já é um assunto mais sério.

 

Fala-nos de objectivos para 2020.

T – Para 2020, já tenho isto fechado. Apesar disso, isto já esteve para acabar. Eu também me farto das coisas e estou sempre a tentar passar bola para ver se alguém continua com o projecto, porque isto não é a minha profissão. Perco imenso tempo, como é lógico e também quero fazer outras coisas. Então isto é quase um dilema, mas quando chego ao fim de cada ano, desde 2016, que essa ideia passa-me. 2019 foi um cartaz de topo. Se esse cartaz fosse um festival, se calhar concorria com o Bons Sons e com os grandes festivais que nós temos, do género, que apostam na música portuguesa. Por exemplo, Mundo Cão, Paus e Luísa Sobral, que foi uma oportunidade única e deu um grande concerto. Ela não é o tipo de música que eu vá a Lisboa ver, mas é uma grande artista, a nível nacional, da escola do jazz. No final, pensei: “O melhor é acabar e sairmos em grande.” [risos] Mas não, a verdade é que tu começas a ver os e-mails, começas a falar com os teus amigos e quando dás conta tens um cartaz ainda melhor do que o do ano passado.  Ainda existe muita coisa boa para trazer ao Fundão, já que ainda não passou cá nem um terço do que Portugal produz em termos de música de qualidade. Eu fiz Dead Combo, como banda, com o Frazão, o Tó Trips e os outros. Eram 5 músicos em palco e foi um concerto do outro mundo. A tocar para 100 pessoas, parecia que estavam a tocar na minha sala de jantar. Mas o conceito e o principio dos Sons À Sexta é essa intimidade e se houvesse uma sala maior, eu não fazia este projecto. Faz sentido neste modelo e tentar convencer os músicos a vir aqui, tocar para 100 pessoas, dá-me um gozo enorme. Mas voltando ao cartaz, só me falta uma confirmação, em Dezembro, porque quero acabar o ano com um grande nome, se calhar até já fora da Moagem, para envolver a comunidade. Queria ver se conseguia fazer uma coisa com algum peso, com a Academia de Música ou com a Orquestra Municipal.

O objectivo para 2020 não é apenas o crescer, mas é de facto que as pessoas vejam a marca. Há, aqui, um cuidado muito grande com a marca, com a maneira como publicamos na página e com a maneira como trabalhamos as redes sociais. Porquê? Porque é a identidade. Nós criámos uma identidade muito forte. Além disso, os Sons À Sexta têm que se transformar mas, ao mesmo tempo, continuar a ser o mesmo, com criações adicionais. A malta fala num festival, mas festivais há em todo o lado. Eu gostava que houvesse exposições digitais, com videoclipes, em que tu entras, metes uns auscultadores e percebes as sonoridades dos sons, ouvindo algumas partes do que aqui passou. Além disso, fazer uma exposição com os cartazes de todas as edições, que são peças de arte, feitas pelo Hugo Landeiro – o melhor designer do mundo. Não é por eu estar ligar ao projecto, mas há claramente uma qualidade visual na nossa comunicação que faz com que, depois, a Antena 3, a RTP e o Gim do Fundão se queiram associar. Então, eu acho que isso merece uma exposição, sendo que eu tenho os cartazes todos assinados, lá em casa, emoldurados – o meu Hall Of Fame [risos].

Também quero fazer um festival, mas não no formato que a malta está habituada. Uma coisa mais ligada ao digital, à semelhança do Semibreve, em Braga. Mexer com esta avenida do Fundão, isto é, haver coisas a acontecer ali, enquanto painéis LED transmitem, aqui. Haver essa interactividade, em que não sabes onde é o palco, porque esta coisa do chegar, sentar e estar ali a olhar só funciona quando é uma coisa assim intimista, como nós fazemos aqui. Ainda assim, há sempre malta que diz: “Concerto tem de ser de pé”. Eu então já vi tantos de pé que agora sabe-me tão bem ver sentado [risos]. Nós vamos dar um festival em que todos podem participar, não só com música, mas com música digital e interactividade. Tentar meter as pessoas a viver a rua, de uma maneira diferente. Principalmente a malta que organiza eventos, se querem que as coisas durem, têm de se adaptar ao ambiente e às pessoas.

 

Relativamente a datas futuras, já confirmadas. O que é que podemos esperar?

T – Dia 3 de Abril é Manel Cruz, dos Ornatos Violeta, depois temos dia 1 de Maio, Mão Morta e dia 6 de Junho, o Sean Riley. Depois, em Agosto, vêm os Jigsaw, sendo que este ano só paramos em Julho. Uma coisa também gira que está a acontecer na cidade do Fundão é as actividades que vão surgindo em paralelo aos Sons à Sexta, como os Sextas de Humor e outros projectos, nos quais eu estou envolvido. Mas as coisas funcionam com o quê? Com gente. Se fizeres coisas só para ti, sem ninguém, não funciona. Por isso, quanto mais pessoas estiverem envolvidas no projecto, sejam vocês, no Cifras.pt, seja a Rádio Cova da Beira, seja a Antena 3, mais fácil vai ser o meu trabalho e mais sucesso vai ter este projecto.

 

Nota: Esta entrevista foi realizada antes do anúncio do Estado de Emergência e de todas as medidas que vêm com ele e, por isso, algumas datas relativas aos futuros espectáculos podem ter sido canceladas ou adiadas. Informem-se, na página do facebook dos Sons à Sexta, sobre os possíveis adiamentos.  



Adicionado por

João Ribeiro

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